sexta-feira, abril 26, 2024
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Economia mundial: não sobe nem sai de baixo

por José Martins, da redação.

Na falta de uma teoria econômica capaz de acompanhar ciclos econômicos e flutuações do capital os economistas do mercado se utilizam do misticismo. Assim, podem afirmar com toda certeza do mundo que, passada a atual pandemia do Covid19, a economia mundial voltará a crescer em 2021. Que se iniciaria novo ciclo expansivo, com maior ou menor intensidade que o anterior (2009/2020).

Essa certeza de que o destino da economia mundial depende unicamente dos movimentos de um obscuro vírus é compartilhada até nas mais distintas famílias burguesas. Como na dos economistas do Banco Mundial, que repetem impunimente essa fragilíssima presunção em seu mais recente Global Economic Prospects [Perspectivas Econômicas Globais].

Reuniram uma centena de economistas, econometristas, engenheiros, historiadores, sociólogos, etc., para editar esse calhamaço de 238 páginas sobre a situação atual e perspectivas de crescimento da economia mundial neste e nos próximos anos. No gráfico abaixo eles sintetizam o crescimento global na última fase de expansão global (2010/2020) e suas previsões para o biênio 2020/2021.

Segundo o relatório, a economia global sofrerá contração de 5,2% neste ano. Nenhum desacordo até aqui. Aproxima-se da avaliação da Crítica da Economia. Entretanto, esquecem-se de ressaltar as consequências catastróficas de uma contração desta magnitude.

Eles mesmos destacam em sua publicação que isso representaria a “recessão” mais profunda desde a Segunda Guerra Mundial, com a maior proporção de economias a experimentar declínio do produto per capita desde 1870. E isso não seria suficiente para impedir a leviana ideia de recuperação já no próximo ano?

Supõe-se, então, na falta de qualquer esclarecimento, que tal “recessão” será contornada sem explosivas rupturas do sistema econômico. Como isso se dará? Apenas como uma natural repetição – em maior escala, off course – uma monótona repetição das outras “recessões” dos últimos setenta e cinco anos. É assim que pensa a economia política vulgar.

Preveem também que Produto Interno Bruto (PIB) entre as economias dominantes, que eles chamam de “avançadas”, deverá encolher em 7% em 2020. Dentre elas, a dos Estados Unidos cairia 6,1%. O Japão cairia exatamente na mesma taxa desta última. A Zona do Euro cairia inacreditável 9,1%.

Todos esses números são também bastante plausíveis, de acordo com outros indicadores mais seguros que a Crítica da Economia acompanha semanalmente, como veremos mais abaixo.

Mas, repita-se, a gravidade destes números catastróficos, que impede qualquer ideia vazia de recuperação imediata do crescimento, mesmo com a autorização do deus Corona, não entra na sua narrativa de um naturalíssimo mundo do capital.

Quanto às economias dominadas – que eles chamam de “economias de mercado emergente e em desenvolvimento” (EMED, no gráfico), dentre as quais se inclui a China – devem encolher 2,5% este ano. Destacam que será sua primeira contração como grupo, generalizadamente, em pelo menos sessenta anos. Para os economistas isso também será sem consequências devastadoras na ordem econômica e geopolítica do imperialismo.

A expectativa de declínio para a renda per capita é de 3,6%, o que levará milhões de pessoas à situação de “pobreza extrema” neste ano. Quando eles falam na sua metalinguagem burocrática de “pobreza extrema” estão se referindo à fome pura e simples, à impossibilidade de milhões de pessoas disporem de alimentos básicos para a sobrevivência física.

A fome será realmente uma baita consequência destes números acima. E eles não consideram outra coisa muito importante: além das já costumeiras multidões famintas nas economias dominadas da periferia – Brasil, Índia, China, Rússia, Argentina, África do Sul, etc. – monumentais hordas de famélicos órfãos da antiga social democracia, do corporativismo, e do estalinismo do pós-guerra explodirão simultaneamente nas grandes metrópoles imperiais, no coração do sistema. Isto já começa a ficar mais visível em quase todas grandes cidades da área euro norte-americana.

Deste modo, apesar de uma prospecção estática razoável das condições da economia mundial em junho/2020, o grande problema deste relatório do Banco Mundial é sua dificuldade de fundamentar seus números e cenários traçados para o 2º semestre/2020 e, principalmente, para o próximo ano.

Assim, segundo sua previsão de referência, em 2021 o crescimento global deve recuperar-se a elevada taxa de 4,2% , com as economias dominantes crescendo 3,9% e as EMED recuperando-se para 4,6%. Mais uma vez não apresentam nenhuma justificativa teórica ou de experiências práticas para esta previsão de robusta recuperação no próximo ano.

A não ser a ridícula esperança de que, nas suas próprias palavras, “a pandemia do COVID 19 se atenue o suficiente para permitir a suspensão das medidas de restrições internas até meados deste ano nas economias avançadas e um pouco mais tarde nas EMED, que os efeitos secundários globais adversos abrandem no segundo semestre deste ano”.

Dependentes sempre dos imprevisíveis movimentos do terrível vírus e, então, a possibilidade de uma pandemia mais prolongada, eles até admitem, sem maiores explicações, claro, que “um cenário mais negativo poderia acarretar uma redução da economia global em até 8% neste ano, seguida de uma recuperação lenta em 2021 de apenas 1%, com uma contração do produto das EMED de quase 5% este ano”.

Tudo depende do COVID 19. Entretanto, este mecânico sanitarismo econômico dos economistas do Banco Mundial está longe de ser confirmado por estudos mais rigorosos evolução da economia em tempo real. É o caso de estudos atualmente desenvolvidos por alguns raríssimos abnegados economistas do Federal Reserve Bank (Fed, banco central dos USA).

Trata-se de estabelecer a prospecção de variáveis de alta frequência da economia estadunidense e de medir semanalmente a evolução da economia, sem aguardar resultados divulgados apenas trimestralmente e até semestralmente, quando a dinâmica da crise já sofreu grandes mudanças.

Os relatórios de perspectivas econômicas do Banco Mundial, FMI, OCDE e outras grandes instituições burocráticas do sistema, por exemplo, são publicados apenas a cada seis meses ou mais. Funcionam melhor nas fases de expansão e normalidade do ciclo econômico. Porém, nas fases de rápida desaceleração e crise da economia estes pesados relatórios já estão desatualizados na dada da publicação.

Saber como está evoluindo a economia em tempo real, semanalmente, quase diariamente, mesmo, é indispensável instrumento para a orientação do navegador no ciclo econômico – principalmente, repita-se, quando este último encontra-se em sua fase de desaceleração e crise, em seu ponto crítico de ruptura.

O índice econômico semanal (WEI, sigla em inglês) que pesquisa índices de alta frequência e é atualizado duas vezes na semana pelos economistas do Fed atendem bastante a essa necessidade. O índice representa o que eles denominam apropriadamente de GDP growth units [unidades de crescimento do PIB].

É um bom indicador da profundidade do choque atual e da velocidade de aterrissagem forçada ou, alternativamente, de recuperação da economia. Quais são, enfim, suas coordenadas de pressão e altitude.

Nesta última versão da curva o WEI (linha azul no gráfico) registrou na primeira revisão da semana terminada em 1º de agosto uma queda de 7.06 % frente ao mesmo trimestre do ano anterior. O capital continua navegando nas águas profundas da depressão.

Enquanto isso, o crescimento anual real do PIB nos últimos quatro trimestres (linha vermelha no gráfico), medido trimestralmente, apresentava uma queda de 9.54% em sua última medição, publicada em 30 de junho.

Enquanto o mercado ainda trabalha com esta última taxa média anual do PIB em queda livre, uma foto estática do 2º trimestre/2020, a última atualização do WEI é um filme indicando queda relativamente menor neste 3º trimestre/2020 ainda em curso.

Mas essa defasagem entre as medições indica uma coisa muito importante. Aliás, a mais importante. Desde o início da crise (29 de fevereiro), quando o WEI registrou o último sinal positivo (+1.58%), a curva da atividade econômica desabou abruptamente até seu ponto mais baixo deste período de crise (-11.45%) em 25/abril. Um desabamento de quase 13 pontos percentuais frente ao índice de 29/fevereiro.

A partir deste fundo do poço a curva do WEI se achata e começa a subir, como aquele paciente que começa a sair de seu coma induzido. Mas esta ascensão foi logo interrompida.

Como destacado fortemente no quadradinho no gráfico, a curva do WEI continuou subindo apenas até a semana de 20 de Junho, quando registrou – 7.85 %, aproximando-se bastante da curva vermelha do PIB do 2º trimestre (-9.54%).

A curva achatou um pouco, mas parou de subir. A partir da última semana de junho, fechando o 2º trimestre/2020, a curva do desabamento da economia se estabiliza em um patamar perigosamente baixo, na faixa de alta volatilidade porem bem definida de (-) 6.5 a (-)7,5.

Sem oscilações mais bruscas na metade que resta deste 3º trimestre/2020, a linha vermelha do crescimento do PIB anual real deste trimestre – a ser publicada em 30/09/2020 – mostrará taxa dentro desta faixa atual do WEI de -7.0 %. Mas esta é uma queda verdadeiramente catastrófica.

Primeira e importante conclusão: ao contrário das perspectivas dos economistas do imperialismo de que a partir deste 3º trimestre/2020 a economia começaria a subir, como vimos acima, o que se observa até agora é exatamente o oposto: a economia mundial não sobe nem sai de baixo.

Os leitores mais atentos já perceberam a importância deste fato. Quer dizer, o achatamento da curva em patamar perigosamente baixo no 3º semestre/2020 impactará decisivamente sobre as possibilidades de recuperação da economia no próximo ano. Ou, no cenário mais provável, de seu irreversível desabamento.

Merece ser aprofundada a análise destes cenários para o próximo ano. Com novos números e fatos reais à mão. É o que faremos a seguir.

 

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