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Guerra comercial e desmantelamento da globalização

As bolsas de valores da China despencaram nesta terça-feira (19), depois de nova ameaça tarifária dos Estados Unidos sobre produtos importados da China. Em Shangai as ações cairam 3,8% e em Shenzhen 5,8%. Em Hong Kong, o índice Hang Seng caiu 3,08%. Os mercados estadunidenses ainda não estavam abertos neste início de manhã em Nova York. Mas os índices futuros já mostram quedas e grande ansiedade no mercado.

O presidente dos EUA anunciou nesta segunda-feira (18) que pediu ao seu representante de Comércio para identificar US $ 200 bilhões em produtos chineses que estarão sujeitos a tarifas adicionais de 10%. Essas tarifas entrarão em vigor se a China não “mudar suas práticas”, acrescentou o presidente em seu comunicado.

Por sua vez, a China disse que responderá ao novo ataque com suas contramedidas retaliatórias se os EUA forem adiante com essas ameaças de tarifas adicionais.

Essa mais recente ameaça tarifária dos EUA veio depois que os Estados Unidos já tinham anunciado na sexta-feira (15) que imporiam uma tarifa de 25 por cento a mais de US $ 50 bilhões em produtos chineses. As tarifas de uma lista inicial de bens no valor de US $ 34 bilhões serão iniciadas em 06 de julho próximo.

Em resposta, a China anunciou tarifas sobre o mesmo valor total dos produtos, com taxas sobre os US $ 34 bilhões de bens dos EUA que deverão ser implementados em julho.

Os números são impressionantes, tratando-se de comércio internacional. Porém, o que está em jogo não são meras listas de bens comercializados entre os dois países. Com efeitos desprezíveis sobre a produção industrial dos dois países.

Ao contrário. É a própria estrutura produtiva das maiores empresas do mundo, tanto chinesas quanto estadunidenses, que está em jogo.

Por exemplo, as ações da gigante tecnológica chinesa ZTE caíram mais de 20 por cento em Hong Kong, nesta terça-feira, depois que o Senado dos EUA aprovou uma lei que tinha implicações para um acordo fechado pelo presidente dos EUA com a empresa para permitir que ela voltasse a fazer negócios com empresas americanas.

A própria produção global do iPhone, o mais popular e mais vendido smartfone no mundo – está seriamente ameaçada. A estadunidense Aple, que produz o iPhone é a empresa com maior valor de mercado do mundo.

Mas agora, com a explosão da guerra comercial sino-estadunidense, a Aple corre sério risco de falência. De todo seu fabuloso valor de mercado virar pó. Não porque as vendas do iPhone no mercado interno chinês serão afetadas, mas porque são montados nas zonas econômicas especiais da China (ZPEs) mais de dois terços da produção global deste brilhante aparelhinho ardorosamente desejado por nove entre dez idiotas da globalização.

O presidente dos EUA já prometeu solenemente a Tim Cook, diretor-executivo da Aple, que a Casa Branca não vai impor tarifas para iPhones montados na China, segundo fontes próximas das negociações da empresa com os dois governos em conflito.

Mas Cook está preocupado que Pequim vá retaliar seus negócios de montagem industrial nas ZPEs do país. Segundo relato da Reuters, o que a Aple realmente teme é que “a máquina burocrática no estilo chinês entre em ação”.

Ou seja, o que se teme na sede da Aple, na Califórnia, é que o governo chinês possa provocar atrasos em sua cadeia global de produção e aumentar as regulações legais sobre seus produtos. Sob a alegação, por exemplo, de preocupações com a segurança nacional. Afinal, não é esse o argumento da máquina burocrática no estilo estadunidense para impor tarifas sobre as importações de aço, tecidos, automóveis, etc.?

Em março passado, em um encontro em Pequim, Cook pediu publicamente que “cabeças calmas” prevalecessem entre os dois países mais poderosos do mundo. Parece agora que ele estava pedindo demais.

Para concluir este boletim, algumas reflexões necessárias para acompanhar com mais disciplina mental este turbulento e maravilhosamente criativo final de ciclo periódico de superprodução de capital.

O que é que se pode vislumbrar por trás deste início de guerra comercial dos EUA com o resto do mundo? E com a China, em particular? O que só a Crítica da Economia está vendo?

Antes de tudo, o esgotamento de um inacreditável período histórico de globalização do capital, ocorrido no pós-guerra (últimos setenta anos).

Não existe em toda a história econômica mundial registro de um período de expansão do capital tão extenso e profundo como este ocorrido nos últimos setenta anos. As relações capitalistas de produção e comércio de mercadorias se encravaram finalmente em todos os poros da crosta terrestre. O lado idílico do processo.

Tudo é capital. Ou era. Acontece que se presencia, nos anos posteriores ao choque global (parcial) de 2008/2009, os primeiros sinais de ocaso desta inaudita expansão global do capital e da ordem imperialista.

E a conta desta ousada aventura capitalista de mais de sete décadas bate na porta da economia de todas as principais economias nacionais. A Odisseia do processo.

Primeira consequência importante desta irreversível fratura histórica: perspectiva de retorno uma crise geral (catastrófica) no horizonte próximo do mercado mundial. Como não se via desde a Grande Depressão dos anos 1930.

Até derrubar catastroficamente a produção global de valor e de mais-valia (momento mais elevado da crise) os problemas aparecem antes na esfera da circulação do capital. No comércio e nos movimentos de capitais do mercado mundial.

As turbulências atuais no comércio internacional entre EUA e o resto do globo representam os primeiros trincamentos daquele cristal aparentemente eterno e pacífico da ordem e progresso do capital pós-guerra.

EUA e China foram as duas economias que protagonizaram com mais intensidade esse formidável período de globalização e, doravante, de trágica perspectiva de paralização do comércio internacional e de catástrofe econômica global.

EUA materializou a dominação e imposição do processo de globalização pelo centro do sistema. China representou e combinou na periferia do sistema imperialista suas correspondentes formas dominadas e passivas.

Duas economias siamesas que, devido às novas circunstâncias da acumulação e crise do capital global estão impelidas a uma forçosa separação. A irreversibilidade de uma destruição inovadora do sistema que agora explode em formas políticas, conflitos entre Estados nacionais. Esta é a verdadeira destruição criativa.

Por isso, neste momento de uma possível e imediata paralisação do comércio internacional, depois de quase noventa anos de plena expansão, os EUA e a China protagonizam os conflitos mais importantes destes trincamentos do cristal de algo que parecia tão sólido.

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