sábado, abril 27, 2024
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Shangai desconecta e Xi Jingping balança

por José Martins, da redação.   Pix 02911418891

Existe uma mitologia oriental muito antiga que descreve um reino caindo em ruinas devido à doença ou depravação moral de seu líder. Não se pode dizer que Xi Jinping, atual líder supremo da China, está doente ou moralmente depravado. Mas o fato é que há poucos dias ele desapareceu misteriosamente da vista do público por quase três semanas. Sem nenhuma explicação. Certamente, esse não é o comportamento que se espera de líderes dos países modernos, mesmo os mais totalitários.

Enquanto isso, a China está meio que caindo aos pedaços. Em um processo assustador rumo a um desastre de magnitude indescritível. O que se pode verificar com toda a clareza do mundo é que muita coisa está podre e cheira muito mal no reino do assim chamado “socialismo de mercado”. Tanto na economia quanto na política. De maneira sincronizada. Como se fosse o resultado de um perfeitíssimo planejamento estatal.

Um fato que ilustra perfeitamente esse apodrecimento simultâneo da economia e da política chinesa é a enorme quantidade de cidadãos da classe média endinheirada que nos últimos anos fizeram grandes dívidas bancárias – na forma de hipotecas – para comprar apartamentos construídos pela Evergrande e outras grandes construtoras semifalidas.

Acontece que esses milhões de investidores em ativos imobiliários agora descobrem que acabaram com apenas propriedades inacabadas e aquelas grandes dívidas hipotecárias para pagar. Imagine as reações de uma enorme faixa da população sendo carregada de dívida sem motivo. Vejamos algumas delas.

A primeira e imediata reação foi a de interromper os pagamentos das dívidas e dar o calote nos já intoxicados bancos chineses. Em toda a China, os compradores de papéis imobiliários estão se recusando a pagar suas hipotecas enquanto as mega- construtoras arrastam para não se sabe quando os projetos de construção real dos imóveis. Compradores de 35 projetos em 22 grandes cidades recusam pagar suas dívidas contraídas nos principais grandes bancos do país a partir de 12 de julho devido àqueles atrasos nos projetos e ininterrupta queda nos preços dos imóveis.

Nota bene: observa-se que não se está a falar aqui apenas de imóveis concretos, de alguma utilidade que o comparador adquire para consumir ele mesmo como uma moradia para si e sua família. Ao contrário, se está a falar, antes de tudo, de um papel de propriedade privada que se compra para auferir uma renda, seja em um fundo de investimento, seja na forma de um aluguel mensal, trimestral, anual, etc. do imóvel concreto sendo cobrado do pobre inquilino.

Trata-se, portanto, de um ativo financeiro como outro qualquer, cujos preços sobem ou descem e que se valoriza ou desvaloriza do mesmo modo que qualquer outro ativo financeiro nos mercados de metais, moedas, títulos de propriedade de empresas (ações), debêntures, commodities agrícolas, minerais, títulos de dívidas privadas ou públicas, criptomoedas, etc. Neste jogo, o operário só entra para ser inquilino e tosquiado pelo proprietário do ativo.

É assim que funciona a moderna propriedade fundiária produtora de renda. Organicamente fundida à propriedade do capital produtor de lucro ou de juros.  Neste sentido, devido à sua enorme classe de proprietários no país (pelo menos 15 % da população de 1,4 bilhão de pessoas) calcula-se que o mercado imobiliário chinês é a maior classe de ativos financeiros do mundo, com um valor de mercado estimado de aproximadamente US$ 155 trilhões (em dezembro de 2021). Maior que o valor de mercado de todas as ações negociadas na Bolsa de Valores de Nova York (Wall Street).

Imagine, então, que nesta crise imobiliária que ora desponta na China ocorra uma queda nos preços dos imóveis de apenas 30%. Só isso já representaria uma perda para os investidores em ativos imobiliários chineses de aproximadamente US$ 47 trilhões. Uma massa de capital (na forma de propriedade fundiária) três vezes maior que o Produto Interno Bruto do país estaria sendo incinerada pela crise.

Explode então uma perigosa crise imobiliária no país mais populoso do mundo e os riscos de dívidas incobráveis ​​para os bancos. O cheiro de fumaça aumenta de maneira preocupante.  O espectro do Lehman Brothers (lendário banco de Wall Street que faliu estrondosamente em 2008, nos EUA, dando origem à popularmente conhecida “crise do sub prime”) aparece em primeiro lugar, e já circula com mais desenvoltura pelos corredores das bolsas de valores de Shangai, Shenzen e Hong Kong.

Se o princípio de incêndio não for contido, os principais bancos chineses – que já enfrentam ressaca de liquidez de Evergrande et caterva – agora também precisariam se preparar para a mega inadimplências dos compradores de imóveis, simultânea à dos vendedores. Aliás, as negociações das ações da Evergrande nas bolsas de valores de Shangai e Hong Kong já foram suspensas há varias semanas.

“As recusas de pagamento ressaltam como a tempestade que envolve o setor imobiliário da China está afetando a classe média do país, representando uma ameaça à estabilidade social”, afirma no portal da Bloomberg o economista Griffin Chan, especialista em mercados chineses do Citigroup.

Marx dizia que quem tem a terra tem o Estado. E assim sendo, a grave crise que fustiga a classe de proprietários fundiários chineses passa a ser a principal fonte de instabilidade do governo de Pequim.

No Fast Money, programa de negócios da CNBC dos EUA, a âncora Melissa Lee e demais especialistas de mercado comentam os crescentes rumores de que o presidente da China, o desaparecido Xi Jinping, poderia renunciar devido à crescente “insatisfação” e revolta da população com sua desastrada administração da economia e com seus mirabolantes (para não dizer misteriosos) mega bloqueios e lokdown da Covid 19.

À medida que for aprofundando a crise econômica global no território chinês começarão também a aparecer os verdadeiros motivos destes idiotas e totalmente anacrônicos “bloqueios da Covid 19” perpetrados continuamente por Xi nos principais centros urbanos do país; principalmente em Shangai com seus 25 milhões de habitantes, que, desde março deste ano, tem ficado total ou parcialmente bloqueada, desconectada do mundo.

Junto com a crise cíclica global e a aproximação da guerra imperialista mundial, a China sofre neste momento problemas graves de ingovernabilidade política. Como qualquer país capitalista. Como acontece simultaneamente com a Inglaterra de Boris Johnson, os EUA de Biden, a Alemanha de Olaf Schols, a Argentina de Fernandez, o Brasil de Boçalnaro; uma fila interminável.

Os burocratas de Pequim sabem disso. E se preparam para a guerra interna e externa. Ou, pelo menos, resistir até onde puder as pressões pela sua destituição do governo central. Os “bloqueios do Covid 19” de Xi e suas facções dominantes no governo são nada mais do que parte desta contra-insurgência e da latente guerra civil.

É por isso que a burocracia dirigente chinesa de Xi não se preocupa mais com os danos que estas medidas de guerra e contra-insurgência possam causar na atividade econômica. A preocupação com esta última não é mais prioritária. Existem coisas mais graves acontecendo.

Se os problemas da falência do mercado imobiliário fossem um fato mais ou menos isolado talvez não fossem suficientes para ameaçar a permanência de Xi e seus aliados no comando da China. Acontece que não é só este pepino que a burocracia de Pequim tem que descascar. Existem problemas muito mais graves que o do mercado imobiliário acontecendo na outrora venerável economia “chão de fábrica” da globalização.

O primeiro e talvez o mais importante problema  da base material do regime é que aquelas imundas cadeias globais de montagem industrial da globalização dos últimos quarenta anos – à qual o governo chinês do “socialismo de mercado” se integrava e se sustentava passivamente – foram abalroadas pelo catastrófico choque cíclico que ora se aprofunda no mercado mundial.

Nada será mais como dantes na nova ordem global. Muito menos para a China. E não tomem essas afirmações com desinteresse ou leviandade. O fato de ruptura é que Shangai, Hong Kong, Shenzen e outros grandes centros burgueses e liberais internos verdadeiramente poderosos forçam pela desconexão territorial no vazio do que restou da ordem anterior. Querem ser Taiwan, Singapura, Coréia do Sul e outras excrescências da ordem imperialista. tão grandes ou maiores excrescências que o moribundo “socialismo de mercado”.

Acontece que aquele capital das grandes corporações globais que migrava avidamente para as plataformas de montagem global instaladas no país e estuprava com as regras mais sagradas do livre mercado a sua classe operária industrial, agora começa a procurar outros destinos menos inseguros e lucrativos. Para não estender exageradamente este boletim, publicaremos proximamente os dados já disponíveis desta diáspora do capital das grandes empresas globais da China.

O que acontece é que a produção e os lucros da globalização derretem com mais intensidade no baleado “socialismo de mercado” do que em qualquer outro lugar. Esse lapso de valorização é intolerável pela burguesia liberal. Questão de sobrevivência. A decrépita burocracia da era da globalização deve ser sepultada para sempre, decidem os burgueses de Shangai, Shenzen e Hong Kong.

E neste balanço de forças desruptivas da ordem politica do país, o próximo sumiço de Xi Jinjping não será mais apenas por algumas semanas. O medíocre líder chinês não será tampouco lembrado no futuro como um líder doente e corrupto, mas apenas como o líder de um governo mambembe que amava trancafiar ridiculamente as pessoas em mirabolantes “bloqueios de Covid 19” nas maiores cidades do país.

A saga chinesa nesta quadratura do ciclo não tem fim. Não cabe, muito menos, em um modesto boletim. Muito pelo contrário. Assim sendo, para não prolongar demais, por hoje, continuaremos neste assunto o mais brevemente possível! Afinal, o destino do mundo real e da revolução proletária internacional depende bastante destas atuais convulsões capitalistas no país mais populoso do mundo.

 

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