por José Martins, da redação.
O Dow Jones Industrial, principal índice da bolsa de Nova York desabava mais de 250 pontos no meio da tarde de sexta-feira (09) devido a preocupações sobre desaceleração do crescimento econômico global. Da China, em primeiro lugar.
Novos dados decepcionantes da produção de automóveis na China revelados durante o dia esfriaram o ânimo dos capitalistas em Wall Street. O Shanghai Composite caiu 1,4 por cento. As ações da Caterpillar caíram 4,2% nos EUA, enquanto as da General Motors caíram 3,2%.
A Associação Chinesa de Fabricantes de Automóveis (CAAM) a principal associação da indústria automobilística da China, informou ao mercado que as vendas de automóveis no país caíram 11,7 por cento em outubro, marcando a quarta queda mensal consecutiva e a maior desde o início de 2012.
As quedas das vendas de automóveis da China estão levando o maior mercado de carros do mundo para perto de uma contração anual não vista desde pelo menos 1990. A CAAM destaca que a queda está ligada à fraca demanda do consumidor e ao impacto de uma economia em desaceleração.
Nos meses anteriores, a CAAM também disse que a guerra comercial estava afetando as vendas. Os preocupantes indicadores da economia real da China são potencializados pela disputa comercial com os Estados Unidos que se arrasta desde o ano passado.
Os dois países impuseram tarifas sobre bilhões de dólares em bens uns dos outros enquanto os EUA buscam um acordo comercial totalmente a seu favor com a China. “Se houver um acordo… será sobre os termos do presidente Donald J. Trump. Não os termos de Wall Street “, disse o assessor comercial da Casa Branca, Peter Navarro, na mesma sexta-feira.
Mas o entrevero comercial de Washington e Pequim é apenas uma das manifestações mais recentes de um longo processo de enfraquecimento produtivo. Não é o fundamento da doença chinesa. Nem será da crise que se aproxima. Logo no início do atual período de expansão cíclica global, meados de 2009 – bem antes, portanto, de Donald Trump se eleger presidente dos EUA – a totalidade da produção chinesa já estava derrapando para fora da pista.
A fraqueza atual da produção de capital na China está relacionada à mais-valia absoluta – aquela forma mais grosseira de valorização do capital caracterizada pelo prolongamento sistemático da jornada de trabalho e de pagamento do salário abaixo do valor da força de trabalho.
A rigidez do aumento da exploração (produtividade) nas economias dominadas deve ser compensada pelo aumento desmesurado da miséria do seu exército industrial de reserva. Não se trata de “superexploração”. Trata-se apenas de exploração relativamente baixa e miséria assombrosamente elevada na periferia do sistema.
A infeliz causa de fraqueza da economia chinesa encontra-se nesta necessidade de seus capitalistas de contínuo aprofundamento da miséria da sua classe operária para a economia nacional continuar circulando pelo mercado mundial.
O aumento da exploração através de “reformas” e desregulamentações do mercado em economias dominadas como China, Brasil, Argentina, México, Turquia, etc., para compensar sua produtividade relativamente inferior à média do mercado mundial implica, necessariamente, em desproporcional aprofundamento da miséria da sua população trabalhadora.
Sabemos desde Smith, pelo menos, que sem salário real justo não pode haver justiça, em seu sentido mais amplo de um aparato jurídico estável de coesão social. A ingovernabilidade aumenta. A superestrutura política balança. A democracia assume formas institucionais mais grosseiras (ou mais reais) que no Estado de direito.
Devido a essas pressões de ingovernabilidade da luta de classes internas – e a consequente dificuldade política de elevar adequadamente a miséria da classe operária – a produção chinesa patina no decorrer do atual período de expansão cíclica global. Observemos este mórbido processo no gráfico abaixo.
Primeira curiosidade que salta aos olhos: uma evolução cíclica de perda de dinamismo da produção muito parecida com a da produção industrial brasileira. Mais do que mera coincidência. Já tratamos em inúmeros boletins as razões desse repentino enfraquecimento orgânico das economias dominadas do sistema imperialista no atual ciclo econômico global.
Observa-se pelo gráfico acima que a produção industrial chinesa sofreu um duplo mergulho no último choque periódico global. O primeiro mergulho, coincidindo com a crise periódica global, ocorre no 4º trimestre 2008, quando atingiu o fundo do poço – índice de 106.433 pontos no gráfico acima.
Ocorre então recuperação fulminante para atingir no 4º trimestre 2009 o índice de 117.933, como destacado no gráfico acima, quase recuperando o índice do pico do ciclo anterior do 2º trimestre 2007 (118.300 pontos).
Para repetir o mesmo procedimento normal de ciclos anteriores a indústria chinesa deveria continuar expandindo. Entretanto, o que se verificou foi um segundo mergulho.
Enquanto as produções industriais das maiores economias dominantes (EUA, Alemanha e Japão) empreendem um período de recuperação do produto e elevação da produtividade, a produção chinesa protagoniza um longo e gradual mergulho. Derrapando para fora das autopistas crescentemente competitivas do mercado mundial.
O índice do Q4 2009 nunca mais foi alcançado. Ao contrário. Como se observa no gráfico, o nível de atividade da produção industrial chinesa caiu gradualmente nos últimos nove anos. Um incrível suave duplo mergulho.
Entretanto, apesar da lenta e gradual queda, o segundo mergulho da produção chinesa bateu no fundo do poço no 1º trimestre de 2015 (Q1 2015), cravando 106.200 pontos. Quer dizer, quatro anos atrás o nível de atividade da indústria chinesa já se situava abaixo do nível do 4º trimestre de 2008 (Q4 2008), abaixo exatamente do fundo do poço do ciclo anterior.
Do Q1 2015 até o presente a produção industrial chinesa perdeu sua capacidade de acumulação. Respira por aparelho. Mantem precários sinais vitais. Depende criticamente das exportações. Que não param de cair. É por isso que o entrevero de tarifas com os EUA aparece para a opinião pública como o golpe letal para a derrocada.
O mais provável é que, nos próximos meses, Washington e Pequim cheguem a algum tipo de acordo. Armistício seria a melhor palavra. Mas isso apenas manteria a economia chinesa na UTI atual, respirando por aparelho. Não resolveria o verdadeiro problema.
Afinal, não é demais repetir, a infeliz causa de fraqueza da economia chinesa, da mesma natureza que a brasileira, argentina, turca, sul-africana, mexicana, etc., não foi contraída apenas depois das retaliações (brandas, por sinal) empreendidas pelo espalhafatoso presidente dos EUA.
Um novo acordo comercial com os EUA não resolverá o problema dos capitalistas chineses. Do mesmo modo que a política econômica dos burocratas de Pequim. É muita veleidade acreditar que a doença chinesa, agravada criticamente no presente ciclo econômico, poderia ser contornada por qualquer expediente externo ao funcionamento da sua fraqueza produtiva endógena.
É por isso que qualquer má notícia vindo de Pequim – como ocorrido na sexta-feira passada (09), anunciando novos sinais de enfraquecimento da sua produção de automóveis – provoca grandes calafrios nos capitalistas globais e queda das ações em Wall Street. Esses sobressaltos globais só tendem a se repetir (e aumentar de intensidade) com mais frequência nos próximos trimestres.
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