sábado, novembro 9, 2024
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A economia chinesa pela bola sete

O governo chinês está otimista com o futuro da sua economia. Mas, na real, seu próprio futuro como governo depende de duas coisas inescapáveis.

A primeira, que o governo dos Estados Unidos volte atrás e desista de aplicar pesadas tarifas sobre as mercadorias importadas da China.

A segunda, que sua própria economia interna saia da estagnação e volte a crescer.

Duas coisas que só o otimismo dos burocratas de Pequim não pode resolver.

Quanto à boa vontade do governo estadunidense em conceder um armistício na guerra comercial, um bom teste ocorrerá nesta quarta-feira (22).

Negociadores comerciais chineses, liderados por Wang Shouwen, vice-ministro do Comércio vão se reunir em Washington com o subsecretário do Tesouro dos EUA, David Malpass, que vai liderar a discussão pelo lado estadunidense.

Esta será a primeira negociação formal entre os dois governos desde que Washington impôs tarifas punitivas às exportações da China em julho, como resposta ao suposto roubo de propriedade industrial (ou patentes) de empresas estadunidenses.

As negociações desta semana coincidem com uma nova aplicação de tarifas de 25% sobre US$ 16 bilhões em produtos chineses. A sobretaxa entra em vigor nesta quinta-feira (23), junto com tarifas retaliatórias de Pequim sobre igual volume de produtos estadunidenses importados pela China.

Importante: simultaneamente a todos esses ingredientes altamente inflamáveis o governo estadunidense também comanda nesta semana audiências públicas sobre a proposta de aplicar tarifas sobre outros US$ 200 bilhões em produtos chineses.

Mais da metade das exportações da China para os EUA estaria sendo sobretaxada. Isso é simplesmente impensável. A economia chinesa entraria imediatamente em parafuso e afundaria. A economia mundial afundaria junto.

As apostas estão abertas. Quem acredita que o governo estadunidense pode relaxar essas ameaças e que as velhas regras comerciais possam ser restabelecidas?

O mercado acredita que sim. O governo chinês também. Tanto um quanto o outro acredita pelo menos em alguma coisa neste sentido mais otimista. Pode ser.

O problema é que o governo estadunidense não acredita. O próprio presidente do EUA, Donald Trump, disse nesta segunda-feira (20) que não espera muito progresso nas negociações que serão realizadas em Washington nesta semana.

Vamos à realidade dos fatos. Antes de tudo, deve-se considerar que o governo estadunidense trata a China com grande desprezo. Como uma débil potência. E como uma economia mais débil ainda.

Quem ficar imaginando fantasias, principalmente a de que tudo que o governo estadunidense anda fazendo em sua política externa é pura extravagância de Donald Trump – estará fadado a não entender absolutamente nada do que está acontecendo neste momento no chão da geopolítica e da economia internacional.

Vejam, por exemplo, esse relato de analistas que cobrem a Casa Branca. Tirem as crianças da sala; e certos liberais moralistas a beira de um ataque de nervos, que até já apelidaram Trump de “Nero do século 21”.

Na quinta-feira da semana passada (16), o presidente dos EUA estimulou seu assessor para assuntos econômicos, Larry Kudlow, a festejar os problemas que a China estaria enfrentando.

Kudlow caprichou no discurso: “ Vendas no varejo, investimento em negócios, estão entrando em colapso na China. A produção industrial tem caído e agora está estacionando em nível baixo. As pessoas estão vendendo a moeda (yuan); pode haver manipulação, mas acho que o principal é que os investidores estão saindo da China porque não gostam da economia, e estão vindo para os EUA porque gostam da economia”.

E, sob aplausos do seu patriota e nacionalista presidente, resumiu o bem informado assessor: “ Neste momento, a economia deles parece uma coisa terrível”.

Exagero? Nem tanto. Puro pragmatismo. Na verdade, os estadunidenses bem informados, como o seu popular presidente, seu assessor econômico, assim como todos os estrategistas geopolíticos e militares a serviço do governo de Washington, sabem que, apesar de muito importante, o problema da China não é unicamente de comércio exterior e de roubo de patentes de empresas do seu país.

A China está pela bola sete. É em nome desta realidade que eles podem até dar uma pequena aliviada nas tensões geradas pela imposição de tarifas sobre a China. Como fizeram com a decadente União Europeia há poucas semanas.

É claro que essas aliviadas passageiras das tensões comerciais não vão resolver nenhum problema, a não ser dos especuladores de Wall Street e alhures. Tanto a China quanto a União Europeia afundarão por outros motivos econômicos. A China antes. Tudo indica.

Os dirigentes estadunidenses sabem que o verdadeiro (e gravíssimo) problema chinês é a sua cronicamente inviável economia. É por isso que não se deve duvidar daquelas eufóricas afirmações de Kudlow no salão oval da Casa Branca.

De todo modo, é bom verificar in loco a situação que se encontra algumas variáveis econômicas fundamentais desta economia chinesa que até pouco tempo atrás era festejada como a grande estrela da globalização, o grande “chão de fábrica do mundo”.

É o que faremos em seguida, ainda nesta semana – exatamente no embalo e no calor das inúteis negociações de Wang Shouwen e David Malpass. Dois funcionários de segundo escalão perdidos no tempo e no espaço de desmantelamento da velha globalização – fazendo de conta que ainda têm toda a autonomia do mundo para tratar de insolúveis pendências da economia internacional.