Mas a roubalheira não é o maior problema atual da política brasileira. Corrupção a gente encontra em toda parte. É da natureza do regime capitalista.
O grande problema atual a ser criado com iminente queda de Michel Temer – perfeitamente esperada pelas pessoas bem informadas, diga-se de passagem – é que, além de outros flagrantes delitos capitalistas, as chamadas “reformas” trabalhistas e da Previdência, aparentemente tão bem encaminhadas, até o dia 17, cairiam juntas com o governo do enviado por Deus para nos governar.
A não aprovação das “reformas” é inaceitável pelo mercado. A razão é fundamentalmente econômica. Sem aumentar exponencialmente a exploração e miséria da classe trabalhadora, os capitalistas que cometem esses crimes com a maior naturalidade do mundo sentem a sua própria vida sendo ameaçada. E tentam reagir. Sem sucesso.
Que se dane o moralismo dos tontos. O que pega na profundeza da alma dos capitalistas e parasitas em geral é o seguinte: – como ficará a economia daqui para frente? – seus lucros vão cair? – qual será a magnitude da queda do preço das suas fábricas, de suas fazendas, de suas grandes propriedades privadas?
As respostas já começaram a aparecer. O mercado financeiro foi tomado pelo pânico do começo ao fim desta quinta-feira (18) com o dólar operando em seu limite superior. No final do dia o dólar comercial cravava uma forte alta de 8,16%, par R$ 3,390. Foi a maior valorização desde 05 de março de 2003.
Havia gente tremendo com a possibilidade de abrupta desvalorização cambial, para algo em torno de R$ 4,00 por dólar. O mais provável é que não aconteça. O país tem elevadas reservas internacionais e fluxos externos positivos. Isso não muda muito no curto e médio prazo. Na abertura desta sexta-feira (19) o real já esboçava certa recuperação.
O impacto de uma improvável mega desvalorização do real não seria tanto nas posições cambiais do governo, pelos motivos apontados, mas nas das empresas privadas alavancadas com forte endividamento de curto-prazo em dólar. Essa temida mega desvalorização também encareceria as despesas de importações com máquinas e insumos industriais, o que reduziria ainda mais os investimentos e o nível de atividade econômica.
Já a Bolsa de Valores – que reflete distorcidamente a realidade dos preços da propriedade privada capitalista – acionou no mesmo dia o circuit break quando o índice Ibovespa caía 10,47%, aos 60.470 pontos. O circuit break é um dispositivo acionado automaticamente quando o índice tem variação negativa de 10% em relação ao fechamento anterior.
A última vez em que esse mecanismo foi acionado tinha sido exatamente em 22 de outubro de 2008,quando o Ibovespa recuou 10,18%.
A Bolsa chegou a esboçar uma recuperação por volta das 15h, com boatos de que Temer anunciaria sua renúncia em seu pronunciamento à 16h. Não renunciou. O Ibovespa aprofundou a queda novamente. Michel Temer, tal como Dilma Rousseff nos estertores do seu desastrado mandato, é a novo bode do mercado. Se continua na sala, a bolsa cai; se sai da sala, a bolsa sobe. Doravante, as cotações devem ser marcadas pela volatilidade, ao sabor dos boatos e do “o futuro a Deus pertence”.
O que é bom para Temer deixou de ser para o mercado. Em termos práticos, acabou seu mandato. Afinal, como observamos em nosso post “Assim é se lhe parece”, na semana passada, qual a utilidade dos integrantes desta quadrilha de Brasília e adjacências se não forem capazes de constituir um verdadeiro governo, quer dizer, um comitê de negócios das classes dominantes que seja capaz de enfiar a faca da reforma trabalhista, da Previdência, etc. nas costas da classe trabalhadora?
Dá para pensar na estabilidade de algum governo que não é capaz de garantir a paz social e, consequentemente, os lucros dos seus patrões? Antes mesmo do terremoto de delações desta semana, o mercado já tinha perdido grande parte da confiança de que Temer tivesse força política suficiente para administrar seus negócios. As provas apresentadas nesta semana de que ele também é um grande ladrão de recursos públicos só fizeram agravar aquela desconfiança.
A pinguela de FHC balança. A burguesia tenta reagir. Com mais dificuldade que no impeachment contra Dilma Rousseff. Como encontrar saída política para o atual aprofundamento da sua crônica ingovernabilidade? O dilema político real da burguesia brasileira neste momento é o seguinte: ela comprova, de novo, que nenhum governo no mundo jamais se sustentou por muito tempo só com parasitismo econômico e crescente repressão policial sobre a população. Se a economia não pega no tranco, como esperavam que a dupla Temer/Meirelles fosse capaz de fazê-lo, a instabilidade política só aumenta. Insuportavelmente.
Esqueçam 2018. O problema é que não dá para esperar até lá com a pinguela de FHC. Ela está balançando demais. A burguesia está à beira de um ataque de nervos. O próprio FHC, o grande oráculo da burguesia brasileira, reapareceu na data de ontem para ler sua bula papal. Pede a renúncia de Temer e sugere a prisão de Aécio Neves, presidente do seu partido. Isso é política. Alguém ainda duvida da gravidade da situação?
Com pinguela ou sem pinguela o problema da burguesia continuará insolúvel até segunda ordem. Se não funcionou a fortíssima articulação burguesa de impeachment de Dilma e posterior blindagem de Temer, por que se poderia imaginar que funcionaria a eleição (indireta ou direta, tanto faz) de um novo presidente da República? Não serviria, como no passado, nem para desviar as energias da luta de classes para obscenas candidaturas e lutas eleitorais de esquerda e de direita. Uma nova eleição seria totalmente inócua nas atuais condições econômicas. Só agrava a situação.
Nenhum governo político no Brasil, civil e muito menos militar, como no passado, se manteria por muito tempo como bom administrador dos pouco lucrativos negócios das classes dominantes e da fumegante luta de classes. Este é um clássico problema de ingovernabilidade. Um problema que se torna cada vez mais insolúvel devido às novíssimas e movediças condicionantes materiais (nacionais e internacionais) que amarram atualmente a acumulação do capital no país. Uma verdadeira quadradura do circulo para os inadequados expedientes políticos do passado.