terça-feira, outubro 29, 2024
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Mrs. Janet Yellen Não Piscou

A taxa básica de juros do planeta continua inalterada. Os capitalistas de todo o mundo respiram aliviados. Mas, ao contrário do que imagina a vã economia vulgar, o capital não vive só de demanda. Os sinais de que a produção industrial está claudicando já são mais do que evidentes. A lei da gravidade, quer dizer, do valor trabalho, não falha. A hora de tempestuosa aterrissagem se aproxima.

Em nossa matéria escrita alguns dias antes da reunião desta quarta-feira (26 de julho) do Federal Reserve Bank (Fed, banco central dos EUA) para definir a nova taxa básica de juros do planeta já antecipamos que ela não seria alterada. Não houve surpresa. Ficou mantida no baixíssimo patamar entre 1% e 1,25% ao ano.
Antes que algum aventureiro lance mão, a Crítica reafirma que a taxa deverá permanecer assim para os próximos doze meses. Se houver alguma alteração, será tão insignificante quanto as duas realizadas nos últimos doze meses. Só para inglês ver. Para dizer que o Fed ainda existe.
Não se trata aqui de palpite ou de expectativas sobre decisões voluntárias dos responsáveis pela política monetária do banco central do planeta. Trata-se da observação de inabaláveis condições materiais contrárias a uma elevação da sua taxa básica de juros. Os bancos centrais terão que obedecê-las.
Não é só a taxa de juros que permanece inalterada neste final de ciclo econômico. Mais além desta volúvel criatura, são os fundamentos da economia que já não se mexem mais. E quando se mexem é para baixo. Enxergar e levar em conta essa realidade foi a grande virtude de Mrs. Yellen na recente reunião do Fed. É uma boa economista.
É justamente por causa dessa realidade e por ser uma boa economista que ela não faz nenhuma aventura com a única coisa que ainda segura (ou prorroga, melhor dizendo) a pesada aterrissagem cíclica da economia de ponta do sistema em qualquer ponto dos próximos trimestres.
Ao não elevar a taxa básica de juros do planeta na última reunião do Fed, Mrs. Yellen optou por manter em níveis elevados as condições de demanda da economia. Tenta-se evitar a maior explosão dos últimos setenta anos em todas as outras economias do sistema, grandes e pequenas.
O Fed faz o que pode para garantir pelo menos a demanda individual de bens e serviços. A baixa taxa de juros e a elevada oferta de moeda e de crédito se espalham como tsunamis cambiais para as demais economias e mantém tremulamente a demanda pelos meios de consumo e serviços de uma claudicante produção industrial em todo o mundo. Mas essas providências anticíclicas, além de não alterar a demanda por novos meios de produção, têm prazo de validade muito curto.
Providências exógenas de política econômica (fiscal ou monetária) nunca corrigem o curso das condições endógenas do processo de reprodução ampliada do capital. Apenas prorrogam a próxima explosão do processo cíclico. Mesmo assim têm alto custo. O atual desbragamento de moeda e crédito será drasticamente cobrado mais na frente.
Efeitos colaterais mais evidentes nos mercados de ações e de commodities já prenunciam atualmente a natureza do problema.
Neste momento, por exemplo, a destrambelhada “exuberância irracional” da segunda metade dos anos 1990 repete-se nas principais bolsas de valores do mundo. Em Nova York, as ações tecnológicas da Nasdaq já superaram os 6000 pontos. Novos recordes são batidos diariamente. A correção será cruel. Muitas vezes mais destrutiva do que o ocorrido na crise de 2000/2001.
Não se trata de se descrever meramente a formação e explosão de “bolhas especulativas” e outras espumas do processo que povoam a cabeça da vã economia. O que há que se observar nestas atuais explosões de preços de ativos financeiros e de commodities é a tênue fronteira entre deflação e hiperinflação.
Essa fronteira será liberada no próximo choque periódico. Em nenhum ciclo dos últimos setenta anos presenciou-se uma devastadora metamorfose dos preços e do valor das propriedades capitalistas como esta que ora se prenuncia.
As bases desta hiperinflação planetária inédita nos últimos setenta anos estão sendo lançadas pela atual política monetária e de crédito dos maiores bancos centrais do mundo.
Os seus responsáveis sabem disso. Mas não conseguem agir para evitá-las. Ao contrário, só agem para aumentar ainda mais o potencial de uma coisa muito parecida com a germânica hiperinflação dos anos 1920. Só que agora ela se espalhará imediatamente pelas principais praças financeiras do mundo. Muito mais devastadora.
Esse é o atual ovo da serpente dos capitalistas: como interromper essa política monetária de criação da futura hiperinflação – que já se prenuncia no avassalador renascimento da “exuberância irracional” dos mercados – sem ser engolido pelas pressões atuais da deflação? Só aumentando a taxa de juros.
Mas dá para elevar agora a taxa básica de juros dos bancos centrais? Não dá. No mundo do capital, mais além do automatismo dos bens e serviços produzidos, existe uma inabalável pedra no meio do caminho de qualquer tentativa desesperada dos bancos centrais neste sentido – no desenrolar de determinado business cycle a evolução das condições monetárias de realização da taxa geral de lucro acabam sempre sendo reduzidas às suas condições de produção. Esse é o limite da política econômica dos governos.
Desde as polêmicas de Jean Baptiste Say (“Lei de Say”), Malthus e David Ricardo, no início do século XIX, os economistas não ultrapassaram, até hoje, a fronteira da produção de bens e serviços ( ou “produto”) e da sua respectiva circulação simples da “oferta” e “demanda”. Não avançaram um milímetro acerca do problema da realização da taxa geral de lucro em determinado ciclo econômico.
Os condicionantes da dinâmica econômica é um verdadeiro mistério para a economia vulgar. Na hora do vamos ver, ela acaba sendo obrigada a aprender no chão de batalha do business cycle que os sagrados juros que seus economistas de carteirinha imaginam que poderiam regular ou estabilizar a economia são dramaticamente subordinados ao lucro gerado na produção, nunca o contrário.
Os economistas da economia vulgar – neoclássica, keynesiana, e suas incontáveis variantes neomarxistas – aprendem a contragosto que não se pode imaginar a economia capitalista apenas como um processo de circulação de bens e serviços.
Com essa limitação não se pode vislumbrar a possibilidade de crise de superprodução de capital. A acumulação e as modernas crises capitalistas só podem ser observadas no processo de conjunto da circulação e produção de capital.
Isso foi muito bem explicado por Rosa de Luxemburgo e muito pouco entendido pelos epígonos marxistas cem anos depois – neste pobre mundo teórico do Estado popular democrático plenamente realizado do início do século 21.
Mrs. Yellen é uma simpática senhora totalmente refém dessa realidade onde as possíveis alterações das taxas de juros são estritamente enquadradas pela flutuação da taxa geral de lucro embutidas nos preços de produção, no desenrolar de determinado ciclo econômico. Os presidentes do Banco Central Europeu e do Banco do Japão também se encontram nesta incômoda situação de reféns do capital propriamente dito.
Assim, além das ilusões da macroeconomia da regulação e da estabilização, o que ora se observa em todo o mundo são as condições de uma claudicante produção industrial. Os dados estampados nos mais recentes relatórios sobre a economia dos EUA são bastante ilustrativos desta fragilidade produtiva de valor e de mais-valia que caracteriza o final de mais um business cycle.
Estaremos proximamente atualizando esses números do mundo turbulento da produção de capital, produtividade, preços e taxa de lucro na economia reguladora do sistema capitalista mundial.

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