quinta-feira, outubro 31, 2024
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Riad e Pyongyang no umbral da 3ª Guerra Mundial

O assassinato do clérico xiita Nemer al-Nemer, nascido na Arábia Saudita, pelos dirigentes sunitas deste pais aliado dos EUA, no último sábado, 2 de Janeiro, poderia ampliar descontroladamente a guerra no Oriente Médio. Incluindo aqui a Turquia, Armênia, Geórgia e Azerbaijão. Mas EUA e Rússia não têm nenhum interesse que isso aconteça. Querem apenas comandar o novo projeto de governabilidade imperialista na região. Não lhes interessa nem um pouco o descontrole da situação. Cada um segura o seu lado. É provável que consigam. Não será uma tarefa fácil. De todo modo, a guerra na Síria entra em um novo capítulo, muito menos favorável para os dois cães de guarda dos EUA na região, Israel e Arábia Saudita, organizadores e executores do mercenário Estado Islâmico. A História rola mais velozmente.

A despeito da moderação imperialista frente a esta última provocação dos sauditas aos iranianos, ela trará consequências imediatas. Começando pela própria forma do assassinato. Junto com Nemer, os terroristas sauditas decapitaram outros 47 seguidores do clérico. Em um estilo que não deixa nenhuma dúvida mais quanto ao principal celeiro e financiador dos “militantes” do Estado Islâmico. A ação terrorista de Riad e seu estilo tornam mais difícil para o governo norte-americano justificar para a opinião pública, principalmente à sua camada liberal interna, por que ele condena com estardalhaço imaginários “terroristas” de Estados absolutamente democráticos como Venezuela, Bolívia, Equador, etc., e, sem nenhum pudor, alia-se a Estados sanguinários como Arábia Saudita e outras execráveis criaturas de Israel, como este amontoado de mercenários do Estado Islâmico. Por isso, em forte editorial de ontem, 5 de Janeiro, o principal jornal do país dispara: “Enquanto a família real saudita vem reprimindo a dissenção e a livre expressão e deixando que sua elite financie extremistas islâmicos, os EUA geralmente têm feito vista grossa ou emitido avisos cuidadosamente formulados em relatórios de direitos humanos” (The New York Times – “EUA têm dificuldade para explicar lealdade á Arábia Saudita” – 05/01/2016)

Os mais fieis aliados dos EUA no Oriente Médio estão perdendo a guerra. Neste sentido, a provocação de Riad a Teerã não foi uma ação impensada ou inconsequente. Foi resultado de graus de tensão insustentáveis e acontecimentos muito especiais. Por exemplo, o massacre do mercenário Estado Islâmico em batalhas nas últimas semanas tanto na Síria quanto no Iraque. Há um início de debandada de quem parecia invencível. Muitas lideranças do Estado Islâmico foram resgatadas por helicópteros das “forças especiais” do exército norte-americano e de Israel e trasladadas para serem protegidas em bases militares no território dos EUA. Esse enfraquecimento do Estado Islâmico tem a ver também com o fato que a Arábia Saudita teve que redirecionar tropas para sua campanha contra os rebeldes houthis no Iêmen, apoiados pelo Irã.

Outro acontecimento crucial para a ação dos sauditas no último sábado é a queda fulminante dos preços do petróleo no mercado internacional, o que está levando as principais economias do Golfo Pérsico a pesadíssima crise econômica. O que pareceria uma piada até pouco tempo atrás, agora aparece como um pesadelo real para as oligarquias tribais da região. E a economia se funde de novo à geopolítica. Na mesma matéria do New York Times, acima mencionada, um resumo dessa explosiva fusão: “Há um grau de tensão raramente visto antes na liderança de Riad. O reino enfrenta uma potencial ‘tempestade perfeita’ gerada pela queda da receita petrolífera, pela guerra no Iêmen, que não tem data para acabar, por ameaças terroristas de múltiplas origens e pela intensificação da rivalidade regional com seu arqui-inimigo, o Irã”.

Mas não é só isso. Como também fica muito claro pela descrição dos fatos enumerados, esse assassinato em massa cometido pelos terroristas de Riad tem razões bem diferentes do que uma simples rixa de sunitas contra xiitas. Aliás, o que menos conta nos atuais conflitos explodindo no Oriente Médio e adjacências é as diferenças religiosas desta ou daquela facção muçulmana. Essa é a versão da mídia imperialista para a opinião pública mundial ignara. Depois da chamada “primavera árabe”, em que predominava os conflitos de classe dentro das diferentes nações, agora sobrepõem os conflitos entre os principais Estados da região. Frágeis e falidos Estados, diga-se de passagem.

Mas, em dimensão bem mais ampla, tanto nos antigos quanto nos atuais conflitos no Oriente Médio o denominador comum são as vicissitudes da governabilidade imperialista no Oriente em toda sua extensão – do Mediterrâneo ao Mar do Japão – e as correspondentes transformações da ordem geopolítica mundial nos últimos sete anos, aproximadamente. De Riad a Pyongyang. Da banalização do assassinato do corajoso clérico Nemer e seus seguidores à fantasmagórica bomba de hidrogênio de debilóides burocratas coreanos. Tudo isso tem tudo a ver com reestruturações econômicas mundiais que agora solapam catastroficamente as sólidas condições que até recentemente garantiam o funcionamento de Estados frágeis de imensas áreas geoeconômicas dominadas. A economia do imperialismo leva necessariamente, mais cedo ou mais tarde, à guerra imperialista. E essas turbulências em áreas dominadas não é o único capitulo, e nem o mais importante. Elas apenas exprimem antecipadamente tensões longamente acumuladas que, mais uma vez, aproximam a humanidade do umbral de uma nova guerra imperialista mundial.